sábado, 6 de julho de 2024

Rich Mullins And A Ragamuffin Band – The Jesus Record

Por April Hefirer

Carlos Fernandes
ILLUSTRATION. T. GREENE

Às vezes, a melhor maneira de processar a dor é encarando-a bem de frente, colocando todas as emoções que ela traz na mesa. Para os amigos — e agora fãs — do cantor e compositor I Rich Mullins, este é o objetivo deste projeto, ao mesmo tempo em que realiza muito mais. E é este "mais" que teria finalmente despertado o interesse do próprio Mullins.

Embora ele tenha terminado de compor e criado o conceito que estava por trás de seu empreendimento seguinte, a morte inoportuna de Rich Mullins, há um ano, em um acidente de automóvel, deixou sua obra inacabada até que uma idéia fosse acalentada para finalizar o que o falecido artista, tocador de cítara, começou. Companheiros íntimos que o ajudaram, tipos musicais surrados de todos os lugares (a.k.a. Mullins' Ragamuffin Band), que apreendiam o manto do amigo, concluíram seu último legado musical, um álbum que ele gostaria de dedicar à narração da história do seu Salvador, da melhor forma que pudesse lembrar. O resultado? Um projeto com dois CDs que fala por inteiro e, o mais importante de tudo, com paixão quem era e é Jesus Cristo.

Carlos Fernandes
The Jesus Record
Rich Mullins & Ragamuffin Band
MYRRH

O primeiro CD, The Jesus Demos, apresenta tratamentos dados a canções originais gravadas de forma nua e crua, que Mullins fez para o seu novo selo fonográfico, duas semanas antes de sua morte. The Jesus Record, produzido por Ragamuffin Rick Elias, traz os companheiros de banda de Mullins, Mark Robertson, Aaron Smith e Jimmy Abegg, e os artistas veteranos Michael W. Smith, Ashley Cleveland, Amy Grant e Phil Keaggy.

Se por um lado as vozes podem não ser de Mullins, as canções deixam poucas dúvidas a respeito da identidade do compositor. Abrindo com um assobio a abençoada My Deliverer, Elias canta, em inglês, o seguinte:

"Meu Salvador está chegando
Meu Salvador está ao meu lado
Ele jamais quebrará Sua promessa
Embora as estrelas possam romper sua fé no céu."

O voltar de Grant para Nothing is Beyond You (Não Há Nada Além de Você), tocada em cordas, lança nova luz sobre um Messias que tudo sabe e tudo pode, ao mesmo tempo em que um piano solitário e desejoso acompanha a tomada rica e de alguma forma poderosamente moderada de Cleveland em Jesus. Smith enfrenta Heaven in His Eyes com enorme autoconfiança, graças a toques apropriados no B-3 e no Wurlitzer. Um coral de vozes se une para conduzir o ouvinte à All the Way to Kingdom Come. A canção executada em violão com cordas de aço, You Did Not Have a Home, pode não falar de Jesus, mas os versos ágeis soam bastante, como Mullins, no refrão repleto de ironia: "A esperança do mundo inteiro repousa sobre os ombros de um homem sem teto."

Os dois únicos cortes que Mullins não interferiu na composição ainda se refletem na perspectiva excêntrica e sincera de um humilde nômade a respeito da vida. Robertson e Beaker utilizam uma apropriada ironia em Surely God is With Us, em que perguntam:

"De onde Ele é, quem é Seu pai?
As prostitutas todas parecem amá-Lo
E os bêbados erguem-Lhe um brinde."

Enquanto isso, Elias corre até o outro extremo do espectro emocional com um suave desempenho na melodia de sua autoria, Man of No Reputation, um testemunho musical marcante da modéstia e humildade de Cristo.

That Where Iam, There You alça a voz de Mullins na gravação demonstrativa e a une com uma diversidade de vozes para fechar o projeto, tal como um P.S. (postscript), uma cítara cantarola solitária ao fim do disco.

Se por um lado muito crédito deve ser dado a todos os envolvidos, o que torna este projeto excepcional são as próprias canções. Ninguém a não ser Rich Mullins poderia colocar pensamentos tão honestos e reveladores (veja a letra de Hard to Get) e ainda ser tão completamente abarcado. Ninguém exceto Rich Mullins ousaria colocar a palavra "ass" (asno, termo que também significa "nádeg-2', em inglês) em uma canção e esperar que a mesma fosse ao ar em uma rádio cristã. Ninguém a não ser Rich Mullins poderia fazer um disco tão radical sobre Jesus que nos obriga a repensar nossas concepções do que — e de quem — trata esta fé cristã. Através deste último conjunto de canções, Mullins continua a assombrar seus ouvintes com uma verdade aparentemente dura demais de se ouvir e bonita demais para se ignorar The Jesus Demos e The Jesus Record começam e terminam no lugar onde deveriam: apontando a todos nós para que fixemos nosso tempo e energia na pessoa de Cristo.


Fonte: CCM Brasil Magazine, págs. 49,50, e.1 a.1998.

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